Wednesday, May 25, 2005

— MAIS SOBRE A “LISBOA, CIDADE TRISTE E ALEGRE” EM:
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Segui aqui, página a página os excertos literários incluídos na Lisboa de Victor Palla e Costa Martins, por me parecer que aqui, o "nosso" ciberespaço, se presta de um modo muito feliz à capacidade de engendrar imagens, tal como previsto pela dupla Palla-Martins no seu poema gráfico urbano em livro.
Retomarei depois os meus comentários sobre estas evocações de imagens outras. Este livro fotográfico tem 32 excertos literários, dos quais 9 são poemas inéditos.

[pág. 147 # FIM]

LISBON BY NIGHT / FADO PARA A LUA DE LISBOA

Ó Lua, espelho do chão
que andas no céu pendurado,
holofote da ilusão
pelo turismo alugado,
não ilumines em vão
os sulcos do empedrado!

Denuncia nas valetas
as sombras que tu arrastas:
prostitutas, proxenetas,
silhuetas de pederastas…
Colos brancos. Rendas pretas.
Casas tortas. Pedras gastas.

As rugas do sobressalto,
ó Lua, não as destruas!
Tu viste carros de assalto
rondarem por estas ruas;
viste rolarem no asfalto
vestes mais alvas que as tuas.

Foste luz a que se expunha
aos tiros a multidão;
espelhaste na tua unha
a secular aflição;
e já foste testemunha
dos fogos da Inquisição.

Procissões do Santo Ofício…
Fileiras de condenados…
À noite, nem só o vício
rasteja por estes lados:
as serpentes do suplício
silvam nos pátios murados…

Ó Lua, guarda o retrato
de tudo, tudo a que assistas!
Não queiras passar ao lado
da desgraça que visitas!
Nem queiras ser infamado
passatempo de turistas!

Clorofórmio dos enfermos,
se foges dos hospitais,
então recolhe-te aos ermos
desertos celestiais!
E enquanto te não merecermos
não te acendas nunca mais!

David Mourão-Ferreira